segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Cristianismo Fora de Foco



          Você já revelou uma fotografia que estava fora de foco? O Modelo estava na posição correta, a máquina fotográfica na posição correta, o fotografo estava na posição correta, entretanto a imagem final tonou-se distorcida.O que aconteceu?  O processo fotográfico consiste de uma câmara escura, uma película foto-sensível para impressão de imagem e uma abertura para entrada de luz. A impressão perde o foco quando há distorção na luz. Mas o que é uma fotografia, se não uma forma de apreender a realidade em uma imagem? Esse processo nos alerta para a seguintes questões: Será que a Igreja de Jesus perdeu seu foco? Se fossemos revelar uma fotografia do cristianismo atual o que apareceria?  Quais as principais distorções e imagens o cristianismo atual (brasileiro) tem produzido?
         
           Para compreender essa questão de foco proponho, por meio de um olhar no ministério dos profetas e de Cristo, uma reflexão sobre o real sentido da voz profética.  

            A principal relação do profeta com a voz profética é a defesa do povo. Mas o que é voz profética? Como a ausência de foco distorce o sentido do termo "voz profética"? Voz profética não é voz politiqueira, nem voz legalista, nem voz preconceituosa, nem voz que defende apenas os ideais religiosos de um único grupo. A voz profética na Bíblia é essencialmente a defesa do outro como Defesa da Vida, mas defesa de que e de quem? Os profetas autonomos (não vinculados ao templo ou ao reino), como Amós, Oséias, Isaias e Miquéias, viviam numa época não diferente da nossa, com partidos políticos e crises morais, entretanto, nunca são vistos defendendo partidos políticos por serem mais favoráveis à sua religião, e muito pelo contrário, o profeta Jeremias, por exemplo, contra sua própria religião pede para que o povo vote no partido opressor (Babilônia) e é altamente reprovado pelos falsos profetas do partido Aristocrata Jerusalemita (Jr 27). A voz profética também não é uma guerra legalista contra atitudes imorais. O principal foco dos profetas também não é denunciar o pecado (legal e ritual) dos líderes, e muito menos do povo. Eu não consigo imaginar o profeta Oséias condenando a prostituição ou o adultério como práticas imorais, (principalmente porque ele casou-se com uma prostituta e uma adultera), ou ver Elias contrário à pena de Morte (matou os profetas de Baal), ou ver Jesus condenando a igreja por aceitar pessoas impura (serviu a "ceia do Senhor" para Judas). Voz profética não é voz legalista, ritualista ou política. Voz profética é a voz de Deus para salvação do oprimido.
          A Voz profética não vê o partido ou a religião, mas a pessoa. Desde o antigo Testamento a voz profética é a ação de Deus para libertação (não apenas do seu povo, mas de todos que dela careciam - Am 9:7). O êxodo fala que Deus ouviu o clamor de seu povo. Foi a necessidade e opressão diante de faraó que motivou a voz profética de Moisés. Faraó representava o governo, a direita, a aristocracia dominante, enquanto que Moisés era a oposição, o MST do Antigo Testamento. Outro caso muito relevante foi o do Sírio Naamã, que independente de usa fé e posição política foi identificado como alvo da voz profética. Amós, Oséias, Miquéias, Isaias e Jeremias também representavam a voz profética como oposição ao Governo e sua aliança com o Templo (Am 5; Os 4-6; Is 1; Mq 3. Jr 7). Não era uma voz legalista, ritual, ou política, mas uma voz profética, voz em defesa do oprimido, explorado, sem direitos e sem defesa. A voz profética do Antigo Testamento primava pela salvação e preservação da vida como foco principal. Os profetas não faziam propaganda de partidos políticos como solução para salvação do povo, antes anunciavam o Juízo de Deus como solução para a opressão e destruição do outro (Am 2,6-16; 3,10-12; 5,7-17; 6,1-7; 8,1-3).
          Ouvi isto, vós que pisais os necessitados, e destruís os miseráveis da terra, dizendo: Quando passará a lua nova, para vendermos o grão? e o sábado, para expormos o trigo, diminuindo a medida, e aumentando o preço, e procedendo dolosamente com balanças enganadoras, para comprarmos os pobres por dinheiro, e os necessitados por um par de sapatos, e para vendermos o refugo do trigo? (Amós 8:4-6).
          Outro exemplo claro está  no ministério de Jesus Cristo. Será que Jesus seguiu no caminho dos profetas? será que assumiu postura diferente de seus antecessores? Novamente o retrato pode nos ajudar. Você consegue ver Jesus defendendo um partido político por ser a melhor forma de exercer seu governo sobre os homens? (como se um partido político fizesse toda a diferença). Você consegue ver Jesus condenando as prostitutas? os adúlteros? os funcionários do governo opressor (publicanos)? como sendo responsáveis pela destruição da família e valores cristãos? A torção da compreensão de "Voz Profética" resulta na interpretação torcida do ministério de Cristo.
            Jesus, como os profetas, não assumiu nem defendeu um partido político, ou um legalismo ritualista, antes defendeu a pessoa da opressão causada pela opressão dos partidos de sua época. Ao Saduceu - Aristocracia Governante - apresentou a parábola do Bom-Samaritano, onde critica a opressão e racismo legalista; ao Fariseu - apresentou sua crítica ao legalismo superficial; aos Zelotas, apresentou sua postura pacifista. Em todas as situações Jesus defendeu a pessoa e apresentou o Pai, como julgador do dia final, e única solução para a humanidade  
           A Voz profética de Cristo não é uma voz Legalista ou Ritualista. Jesus não se pôs a condenar o mundo; nem mesmo criticou, sua missão é salvá-lo. Jesus não deixou que questões laterais alterassem seu foco. O ritualismo e o legalismo acabaram por ser derrotados pela urgência e superioridade de seu alvo: a salvação do oprimido. Jesus entendia bem que o principal problema do mundo não era o pecado ritual ou legal, mas a alienação (Paul Tillich). Assim, não lutou contra o pecado (ritual e legal), você não vê Jesus travando uma luta para "purificar" o mundo, ou as pessoas, mas para desaliená-las. Jesus não condenou a mulher adultera (Jo 8:11); nem a pecadora (Lc 7:37-50); muito menos os leprosos ingratos (Lc 17:12ss); ou o cobrador de impostos (Mt 9:9); entretanto todas essas pessoas e muitas outras foram desalienadas, incluídas na vida de Deus, integradas em seu reino. Jesus não perdeu o foco diante do pecado (Ritual ou Legal). Mesmo os traidores indignos partilharam da voz prófética (Jo 13), pois, para Jesus, a restituição da pessoa é o alvo da voz profética. Jesus entende que não é o pecado que está destruindo as famílias, mas a opressão politica e religiosa que aliena as pessoas de Deus, do próximo e de si mesmas, levando as pessoas a destruirem-se, e o pior é que entendiam que essa distorção era um serviço prestado a Deus (Jo 16:1-2).  
          Assim, como está nosso retrato hoje? Qual impressão nossa vida produz diante do feixe de luz da mensagem dos Profetas e de Cristo? e como a Igreja de Jesus está na foto?
          Infelizmente há muita distorção! Várias outras mensagens estão sendo pregadas em lugar de Cristo. O Legalismo e o Ritualismo estão sendo colocados como centro da Igreja, o que tem levado muitos a verem o pecado como principal problema do mundo e ao não entendimento da alienação de Deus e do próximo como a maior ameaça da raça humana.
         Nesses tempos de política, quando as luzes estão apontadas para a posição da Igreja, a foto é revelada drasticamente, e muitos "evangélicos" desejam descaradamente voltar para idade média. Será que não aprendemos nada? será que os mil anos de trevas presos a um Estado governando ao Lado da Igreja não foram suficientes?  Será que as atrocidades praticadas por Calvino em Genebra não foram suficientes? O poder cegou os olhos da fé de modo que muitos não conseguem enxergar as distorções e distanciamento de Cristo. Não enxergam seu torpe desejo por poder que almeja impor sua vontade sobre a do fraco e do oprimido, seu senso de justiça está distorcido, pois o mal para o outro não tem problema desde que o bem para eles seja imposto, e isso, custe o que custar.
          "É vontade de Deus que os crentes estejam no poder, pois assim poderão pregar a palavra de Deus". Essa frase é uma grande falácia! (Até parece que os crentes gostam de pregar a palavra de Deus! Do jeito que o cristianismo anda, é provável que, se houver uma lei reduzindo a regularidade do culto para uma vez por mês, os crentes sejam os primeiros a aprovar.) 
          O deslocamento do foco é nítido assim como a ausência total de padrão ético.  Os crentes podem estar no poder para impor sua vontade e os outros que lhe submetam. O que aconteceu com o amor ao próximo? e como o amar o outro como a si mesmo? e ao Amar aos vossos inimigos, pois amar os amigos é fácil? Não vemos ninguém se levantar com uma posição cristã. Realmente falta voz profética, mas a autêntica voz profética, que procura a vontade de Deus em primeiro lugar. O Ide de Jesus foi abandonado e está sendo trocado por debates legalistas e moralistas em torno de temas polêmicos, o amor está sendo trocado pela agressão polítca e pública, os padrões éticos do evangelhos foram substituídos por uma ética marqueteira interessada em poder e desinteressada do Outro. O termo "a qualquer custo" passou a ser um imperativo entre candidatos "evangélicos". Eu nunca vi, em toda minha vida de evangélico, tamanha nojeira política envolvendo a Igreja de Cristo!
         Fora de foco? Não.
         Na verdade, o filme já queimou faz tempo.
        Que Deus possa nos ajudar! 















 







domingo, 19 de setembro de 2010

PENTECOSTAIS: ARMINIANOS OU CALVINISTAS?

Escolhi abordar esse tema em vista da grande confusão existente na compreensão da doutrina da Salvação e sua relação com os sistemas calvinista e arminiano.

Originalmente os Pentecostais descendem do movimento de rua Azuza que, por sua vez, desenvolveu-se a partir do movimento Holiness (Movimento de Santidade) motivado e propagado pelo metodismo. Para entender esse movimento precisamos compreender primeiro o calvinismo.

O Calvinismo, nascido na reforma, é a adoção do sistema teológico (Platônico) defendido por Agostinho de Hipona aliado a uma forma de governo “teocrática” (Governo de Deus), sendo que prefiro o termo “eclesiocrática” (governo da Igreja).

O Movimento de Santidade nascido de dentro das igrejas reformadas (principalmente metodistas), procura enfatizar a necessidade de uma conversão individual, uma conversão pessoal e verdadeira. Isso só pode ser entendido se conhecermos a doutrina da salvação pós-reforma: Sola Fide e Sola Gratia.

Ambas as doutrinas – Sola Fide e Sola Gratia – foram escritas em oposição à Igreja Católica Romana que pregava as indulgências como forma de alcançar a salvação. Assim, para o catolicismo a pessoa só chega a Cristo por meio da Igreja; e na reforma protestante, a pessoa só se torna a igreja por meio de Cristo. Dessa forma as indulgências foram banidas e a salvação passou a estar unicamente em Deus, ocultas em Deus, nos seus decretos eternos. Somente Deus decide a salvação, nada, nem mesmo os “sinais de salvação” (que é a vida na Igreja) podem afirmar a salvação. Podemos concluir nesse super-breve resumo que a doutrina da salvação na fé reformada nasceu em oposição à fé católica, e foi desenvolvida numa prática nacionalista: A Alemanha é Luterana, Genebra é Calvinista, Inglaterra é Anglicana, etc...

Essa perspectiva sem participação humana fez com que a salvação fosse algo nacionalista, todos que nascem na Alemanha são luteranos, não precisam aceitar Jesus, pois já nascem em uma nação protestante. O mesmo aconteceu com as nações calvinistas.

Em oposição a essa perspectiva de salvação infrutífera e impessoal surgiu o movimento de Santidade procurando recuperar o vigor da Igreja Primitiva, retornar ao primeiro amor, encontrar o verdadeiro sentido da salvação. O principal advogado desse espírito de reavivamento foi Wesley. Sua principal mensagem foi a “segunda benção”, uma experiência de coração aquecido que despertava amor pelas almas. Wesley afirma que só se converteu verdadeiramente após seu aquecimento de coração. Essa mensagem produziu grande aversão no protestantismo da reforma, pois contrariava os “Sola’s” e pregava a necessidade de uma conversão genuína, duvidando da “conversão nacional”. Esse movimento de despertamento encontrou força no Arminianismo, uma vez que sua teologia (uma moderação do calvinismo) procurava levar as pessoas a participarem de sua salvação, a buscarem santidade e mudança de vida.

Diante desse breve histórico esboço uma pequena teologia sistemática para compreensão do problema e definição de uma linha teológica para o pentecostalismo.

PRINCIPAIS CRENÇAS PENTECOSTAIS:

a) Os pentecostais crêem que se uma criança morrer na idade da inocência não vai para o inferno.

b) Os pentecostais crêem em livre arbítrio – O Homem é responsável por seus atos.

c) Os pentecostais não crêem que Deus escolheu uns para o céu e outros para o inferno.

Mediante essas três afirmações esboçarei os erros teológicos comuns às teologias pentecostais contemporâneas e proporei um pequeno esboço de teologia que condiga coerentemente com nossa fé pentecostal.

ERROS TEOLÓGICOS COMUNS:

MISTURAR CALVINISMO COM ARMINIANISMO. O principal erro teológico na maioria dos teólogos pentecostais é entender que teologia é salada de fruta, podendo colocar e tirar o que quiser e quando quiser. A teologia SISTEMÁTICA indica que existe um sistema de idéias interligadas, ou seja, a doutrina de Deus está ligada com a doutrina do homem e com a doutrina de Cristo, Salvação, Espírito Santo e Escatologia, uma alteração na doutrina do homem, ou em qualquer outra, e todo o sistema estará comprometido. Veja o seguinte exemplo bem comum:

“[...] a Biblia não só revela o primeiro estado do homem, como relata a história da perda do seu primeiro estado de santidade, pela Queda, e também a possibilidade de sua restauração (Cl 3:10; Ef 4:24)”; “Portanto, já nascemos espiritualmente contaminados (Rm 5:12) [...] o homem tem dentro de si uma natureza pecaminosa [...]”; “Segundo a Bíblia, o pecador não sabe escolher o bem; ele sempre opta pelo mal [...] a causa é o pecado congênito em nossa natureza decaída”; “Deus não elege uns para a salvação, e outros, para a perdição. O homem é capaz de fazer a livre-escolha. E a graça de Deus não é irresistível, como muitos ensinam [...]”(GILBERTO A, et all, Teologia Sistemática Pentecostal, Rio de Janeiro:CPAD, 2008, pp.306,344,346,367).

“Adão e Eva foram criados “bons” (p.267) [...] o pecado de Adão afetou muito mais que a ele próprio [...] Esta questão é chamada pecado original [...] Por estar a natureza humana tão deteriorada pela Queda, pessoa alguma tem a capacidade de fazer o que é espiritualmente bom sem a ajuda graciosa de Deus.”; “Se o pecador optar por arrepender-se e crer, Deus é o único agente ativo. Se o pecador optar por não se arrepender ou não crer, a culpa é inteiramente deste” (HORTON S. M. Teologia Sistemática, Rio de Janeiro:CPAD, 2002, p. 267-269;p.367)

Ambos os autores (Assim como muitos outros teólogos pentecostais) produzem um erro teológico grotesco: Como uma pessoa que tem sua natureza caída pode chegar a crer sem a atuação de Deus? Como uma pessoa com a natureza caída pode possuir livre escolha? Como alguém com natureza deteriorada pela Queda pode escolher arrepender-se e crer? O sistema calvinista possui uma resposta que condiz com seu sistema: A Eleição Eterna e Incondicional de Deus, já os pentecostais querem que o homem possua uma natureza caída e sejam capazes de escolher crer ou não crer.

DESCONSIDERAR A CAUSALIDADE. Outro erro conseqüente do primeiro é ignorar a causalidade em um sistema. Todo sistema, para ser um sistema, deve ter princípios de causalidade (Causa e Efeito). Assim, a crença na doutrina da Queda produz os seguintes efeitos: A Queda pressupõe estado de Graça Original, que por sua vez pressupõe o Pecado Original, que pressupõe a total incapacidade humana; que pressupõe a Eleição e Salvação unicamente por Deus. Ou seja, crer na Queda é o mesmo que crer na eleição incondicional para o céu e para o inferno, e crer que as crianças serão condenadas, mesmo na inocência.

CONSTRUÇÃO DE UMA TEOLOGIA ARMINIANA MODERNA

O Arminianismo original também acreditava na Queda, o que gerava uma crise em seu prédio teológico (heresia), motivo por que foi condenado no sínodo de Dort. Assim, uma teologia pentecostal equilibrada com suas crenças salvíficas deve:

1) Acreditar na Criação perfeita, mas sem algo como a Graça Original. No máximo, podemos afirmar que a graça original era a presença de Deus que o homem perdeu.

2) A consequência será a eliminação da doutrina da Queda e do Pecado Original. (Termos que a propósito, nem aparecem na Bíblia). O Pecado não deturpou a natureza humana, mas afastou o homem de Deus. O homem tem a capacidade de decidir-se por Deus em Cristo desde que tenha sido alcançado pela ação (externa) da palavra, da Igreja e do Espírito Santo.

3) Essa doutrina possibilitará uma doutrina da Salvação mais equilibrada, onde o homem pode decidir seguir ou não a Cristo, mas sem Cristo, sua palavra e seu testemunho, o homem não tem como decidir-se pela salvação. Ele pode escolher, mas apenas em Cristo. O Homem não se salva, mas encontra a salvação.

4) A salvação não é uma regeneração natural de um pecado natural passado de pai para filho, mas a aproximação do homem a Deus mediante Jesus Cristo.

5) O Espírito Santo não é um agente interno para salvação (Sendo derramado nos corações para convencer os homens do pecado), mas um agente externo de testemunho da palavra de Deus por meio dos sinais e do poder e missão da Igreja. O Espírito fortalece o crente para testemunhar e alcançar os perdidos.

6) Eclesiologia: Ser igreja é viver o IDE

7) Escatologia: Aproximação e Identificação de toda humanidade com Deus por meio de Cristo.

Qualquer dúvida estou a disposição

Pf. Eduardo Sales de Lima

terça-feira, 14 de setembro de 2010

A POLÍTICA DO TEMPLO DE SALOMÃO E A CRISE ÉTICA DA IGREJA ATUAL

Recentemente assisti uma reportagem na Record sobre a Construção de uma réplica exata do Templo de Salomão em São Paulo como sendo a possibilidade de um grande reavivamento da fé evangélica em todo o mundo. Paralelamente acompanho as crises marketerias entre Pastores e Políticos, em que o nome de Jesus e Satanás são usados para propagar campanhas políticas. E por fim os Mega-Eventos evangélicos, Shows de música Góspel, Congressos e mais Congressos em que o povo de Deus, cegamente confia sua salvação. Qual a ligação desses eventos? Será que representam sinais de uma grande crise ética na Igreja de Cristo?

Para começar essa reflexão vejamos o que é ética:

Numa de suas definições mais simplórias, a ética é a norma de certo e errado. Todavia essa definição não se aplica bem à ética, pois os conceitos de certo e errado são regulados pela moral, dessa forma a ÉTICA por sua vez é o estudo da atividade humana com relação a seu fim ultimo, que é a realização plena da humanidade .

Moral: conjunto de princípios, crenças, regras que orientam o comportamento das pessoas nas diversas sociedades. Ética: reflexão crítica sobre a moral e sua relação com o fim último da sociedade. (fim último= Objetivo Ideal).

Para entender o conceito de ética baseado no ideal proponho o seguinte quadro sobre a ética e sua relação com o Sagrado e o Profano:



O que esse quadro revela? Nada além do distanciamento ético da Igreja em relação a Jesus e ao cristianismo primitivo. Será que Jesus aprovaria uma Igreja que vive para o Templo? Que tem na prática dos rituais eclesiásticos e de purificação do mundo o centro de sua fé? Será que a Igreja atual (principalmente seus líderes) preocupados em preparar crentes para atender às necessidades da Igreja esqueceram de preparar os crentes para as necessidades de Cristo?

A infeliz realidade ética é que a Igreja atual não forma servos de Cristo, mas servos do Templo. A reconstrução do Templo de Salomão é a prova real de que a Igreja atual não sabe a que espírito pertence (Lc 9:54-55), pois o Templo de Salomão foi uma das instituições que mais oprimiu o povo hebreu. O Templo era usado como forma de opressão e arrecadação. Não era um local de culto e adoração, mas de manipulação e opressão religiosa.

A autoridade do rei provinha do Templo; a força do exército provinha do templo; os códigos legais provinham do templo; as grandes decisões dependiam do Templo; com toda essa representatividade não demorou para que a economia fosse dominada pelo templo. As alianças políticas e econômicas eram efetivadas no templo, Gn 31:53; tornou-se legislador da economia Nm 31:12; Dt 20:14; orientador da prosperidade Ml 3:10; da produção e agricultura Rt 1:6; Ez 8:14; restauração de relações comerciais Lv 6: 1-7; regulamentava o serviço bancário Dt 23: 19-20; 24:10-13; regulamentava os direitos do trabalhador Dt 24:14-15; regulamentava a contribuição social e sustento do templo pelo dízimo Dt 26: 12- 14; serviço cartorário de guarda das escrituras, casa do Tesouro Ml 3:10; Depósito do tesouro real 1Rs 7:51; 2Rs 16:8; 18:15; 2Mc 3; Segundo Josefo os mais abastados guardavam suas riquezas no templo devido à segurança que ofereciam, mesmo as viúvas e os órfãos guardavam sua poupança no templo 2Mc 3:10; Ne 12:44; 13:5ss; O templo de Jerusalém possuía 7 grandes cofres de coleta: 1) para o imposto da didracma; 2) para os sacrifícios diários; 3) para o excesso dos tributos anuais; 4) para as sobras dos sacrifícios diários; 5) fundo de administração da farinha, vinho e óleo; 6) fundo de construção do Templo; 7) para o Tesouro do Templo; è provável que também concedesse empréstimos à Juros, pois Josefo afirma que assim que os zelotas tomam a cidade em 66 d.C. imediatamente queimam os arquivos do templo para eliminar as provas de sua dívida. O Serviço de Imposto de Renda e Regulação da Economia estavam ligados direta ou indiretamente ao Templo. (SALES, E – Ideologia Política no Antigo Testamento, CETAD – 2009).

Uma leitura cuidadosa dos profetas permite situar o Templo a partir da perspectiva do povo. No profeta Oséias, os sacerdotes desejavam o pecado do povo, pois aumentaria a oferta (Os 4:8); no profeta Amós, o templo pertence ao Rei e não a Deus (Am 7:13); em Jeremias o Templo virou covil de ladrões (Jr 7:11) e para esse profeta, como para Isaias, Deus nunca pediu sacrifícios (Jr 7:22; Is 1: 11-15); e por fim o próprio Templo é questionado como casa do Senhor (Is 66:1-3). Essa perspectiva é renovada nos profetas do Exílio com a idéia de um novo templo (Is 6517; segundo o coração do Senhor Jr 31:31; Ez 11:19). Nos apocalipses apócrifos é comum a idéia de um novo Messias e um novo Templo. Essas noções são confirmadas por Jesus que desenvolveu seu ministério fora da opressão do Templo que separava o Sagrado do Profanos condenando os povos de outras nações como Profanos e Impuros. Diante dessa perspectiva Jesus profetizou a destruição do Templo e a reconstrução a partir de sua própria ressurreição (Mc 14:58; Mt 24:1-2).

Mas por que os crentes anseiam pelo Templo? Pelo mesmo motivo que despendem tanta energia e dinheiro com Mega Eventos, com Shows de música Gospel, Congressos e mais congressos, ou seja, por ter-se tornado numa comunidade Eclesiocêntrica (Igreja no Centro). Assim como no Antigo Testamento, as comunidades atuais tem trocado o Senhorio de Cristo pelo Senhorio do Templo. Toda a vida das comunidades que se dizem evangélicas está centraliza no Templo. Se acabarem os cultos e os ritos as comunidades evangélicas atuais morrem. Sua fé, sua liturgia e sua ética estão centralizadas no Templo de forma que, toda divergência do Templo é tida por herética, proscrita e profana, como no judaísmo antigo. Será que a ética de Jesus condiz ou contrapõe essa ética que qualifica o puro e o impuro a partir dos rituais e da legislação Religiosa?

Desde o princípio Jesus assumiu uma ética do Outro, diferente da ética assumida pelo Judaísmo antigo e pela Igreja Atual.

Segundo Brueggemann (1983), o ministério de Jesus foi uma crítica que, como nos profetas, se opõe às estruturas dominadora e busca a libertação do povo. Afirma que, com o perdão (Mc 2:1-11) Jesus liberta Deus das cadeias do Templo, pondo em risco toda sociedade que, naquela época, era organizada a partir do Templo, principalmente os mecanismos de coleta. Confrontou a opressão oculta no Sabath (Mc 3:1-6); e a presença de Jesus para comer com os pecadores (Mc 2:15-17) era uma forte ameaça ao sistema de sacrifícios e às tradições e rituais de purificação. Em sua oposição ao Templo (Mc 11:15-19; Jo 2:18-22) por citações extraídas do profeta Jeremias (Jr 7:11), colocou em risco a doutrina da predestinação baseada na eleição especial de Sião e do Templo. (SALES, E – Ideologia Política no Antigo Testamento, CETAD – 2009).

A ética de Jesus valoriza o Outro acima da Lei (Jo 8); o perdão que deveria ser comprado com sacrifícios no Templo foi substituído pelo perdão gratuito na fé em Jesus; as autoridades foram substituídas pela disposição de uma criança (Mt 18:1-3); Jesus libertou o culto das rixas étnicas e culturais (Jo 4); propôs o “Ide e fazei discípulos” como principal tarefa da Igreja (Mt 28:19); ensinou a superação da justiça legalista como critério para adentrar ao Reino de Deus (Mt 5:20); e o amor ao próximo como resumo da Lei e dos Profetas (Mt 7:12; Mt 22:40). Assim diante dessa ética de Jesus, por que as comunidades que se denominam evangélicas ainda assim continuam seguindo a ética do Templo?

A ética do Templo é uma ética política baseada na profanação do Sagrado pela sua relação com os poderes seculares (O Templo a serviço do Estado). Desde sua criação o Templo de Salomão foi um modelo religioso de manipulações políticas (1Rs 1). Durante a história dos reis de Israel e de Judá o templo serviu aos propósitos do Rei que constituía e depunha os sacerdotes de acordo com seu partido político-religioso. Quando Jerusalém foi governada por Reis Javistas, o sacerdote do templo era Javista, quando foi governada por Reis crentes em Baal, o sacerdote do templo era de Baal. O papel do templo era legitimar a realeza e suas formas de opressão (Am 7:13; Jr 7).

Atualmente muito da ética das comunidades chamadas evangélicas tem contribuído para a profanação do nome de Jesus, usando-o para promoção de campanha política: “Vote em mim porque sou um candidato de Jesus”; “Não vote em fulano porque não é um candidato de Jesus”. Esses argumentos são profundas falácias e manipulações do Sagrado com objetivos eleitoreiros. É uma vergonha que Homens e Mulheres de Deus façam tal profanação de seu nome. Assim, observe a falácia: Será que existe candidato de Jesus? Ou melhor, uma coisa é servir ao Reino de Cristo por meio da Política e outra coisa é usar o serviço ao Reino de Cristo como propaganda eleitoreira. Enfim, a maior prova das falácias são as muitas candidaturas que naufragam revelando que não eram tão de Deus assim, pois se fosse, teriam inevitavelmente ganhado. Como toda demagogia e falácia, falar é fácil!

É uma vergonha que líderes “cristãos” ainda não tenham aprendido de Cristo como tratar seus opositores, pois Cristo até a última hora partilhou seu pão com Judas, foi entregue à cruz e em todas os momentos venceu a violência da cruz pela não violência da fé (René Girard). Cristo não destruiu os diferentes e pecadores, ou os que lhe atacavam, nem ainda os traidores. Quanto mais lhe atacavam, mais misericórdia recebiam.

Por outro lado, numa atitude muito diferente de Cristo, muitos “homens e mulheres de Deus” se põe a demonizar o outro, destruir a integridade moral e social do próximo dizendo que com isso prestam um serviço a Cristo, essa atitude de destruição do outro é classificada na Bíblia como Satânica (Jo 10:10), assim como a utilização do Nome de Deus para fins pessoais (Mt 4:1-11), essa ética é classificada como satânica por ser Anti-Cristo.

Por fim essa ética torcida de comunidades que se chamam evangélicas, que valoriza o templo como instituição de centralização da vida religiosa e propõe a destruição do outro (seja quem for) pela demonização e manipulação do sagrado expressam seu verdadeiro interesse, que não é a propagação do reino de Cristo, mas de seu próprio reino. Ao usar o nome de Deus, pretendendo ser guias de cegos, legislam em causa própria, envergonham o evangelho de Cristo trocando-o pela antiga mensagem do senhorio de Deus executado pela ética do Templo que funciona sob a mão do carrasco opressor.

Que Deus Tenha misericórdia de Nós!